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Quando nos perguntam porque fizemos isto ou aquilo, porque decidimos ou optámos de determinada maneira. Podemos responder de duas maneiras: Ou dizemos as verdadeiras razões ou, para preservá-las, podemos responder simplesmente: Cá por coisas...
Vou inaugurar uma nova "tag" com pequenos excertos de livros que li ou estou a ler. São pequenas passagens dos livros que acho interessantes, cómicas, emocionantes ou simplesmente porque gostei. Eis a primeira, que apesar de não reflectir em nada o conteúdo do livro em questão, a achei muito divertida:
"O tio Leão XII (...) Tinha um interesse singular por dentaduras postiças, contraído numa das suas primeiras navegações pelo rio La Magdalena, e por culpa da sua devoção maniática pelo bel canto. Numa noite (...) apostou com um agrimensor alemão que era capaz de acordar as criaturas da selva a cantar uma romança napolitana do passadiço do comandante. Por pouco não ganhou. Nas trevas do rio ouviam-se os adejos das graças, o rabear dos jacarés, o pânico dos sáveis a quererem saltar para terra firme, mas, na nota culminante, quando se receou que o cantor rasgasse as artérias com a força do canto, a dentadura postiça saltou-lhe da boca num fôlego final e afundou-se na água .
O navio teve de ficar três dias no porto Tenerife enquanto lhe faziam outra dentadura de urgência (...) Mas na navegação de regresso, ao tentar explicar ao comandante como tinha perdido a dentadura anterior, o tio Leão XII inspirou a plenos pulmões o ar ardente da selva, deu a nota mais alta que foi capaz, manteve-a até ao último alento, tentando espantar os jacarés deitados ao sol que apreciavam sem pestanejar a passagem do navio, e também a dentadura nova se afundou na corrente. Desde então teve cópias dos dentes em todos os lugares da casa ..."
Gabriel Garcia Márquez in O Amor nos Tempos de Cólera (1985)